sábado, 20 de setembro de 2014

A Inquisição Católica

A Inquisição Católica
Objetos de tortura, usados durante a Inquisição existem aos milhares.
Alguns curiosamente se encontram ainda em Igrejas e outros foram removidos para
museus. São testemunhas mudas de um período de horror e intolerância religiosa
que não pode ser negado ou mesmo esquecido. Nem de longe são instrumentos cristãos,
Todavia foram usados como tal por uma instituição que diz tê-los usados "em nome de Deus".
É claro que foram usados em nome de "Deus", mas do Deus dela: o Diabo.

Prólogo
Início do século 13. Dizia-se que todo o sul da França estava infestado de hereges. O bispo local fracassara em suas tentativas de "desarraigar estas ervas daninhas da diocese", que se dizia ser exclusivamente católico. Julgou-se então necessário tomar medidas mais drásticas. Os representantes especiais do papa “na questão de heresia” entraram em campo. A Inquisição tinha chegado à cidade.
As raízes da Inquisição remontam aos séculos 11 e 12, quando vários grupos dissidentes começaram a surgir na Europa católica. Mas, a Inquisição propriamente dita foi inaugurada pelo Papa Lúcio III (foto), que reinou entre 1181 e 1185, no Sínodo de Verona, Itália, em 1184.
Em colaboração com o Imperador do Santo Império Romano, Frederico I Barba-Roxa, ele decretou que qualquer pessoa que falasse ou até pensasse em contrário da doutrina católica fosse excomungada pela Igreja e devidamente castigada pelas autoridades seculares. Instruiu-se os bispos a inquirir (do latim, inquírere) os hereges. Isto foi o início do que foi chamado de Inquisição Episcopal, isto é, situada sob a autoridade dos bispos católicos.
Estava começando um período terrível para a humanidade, onde milhões de homens, mulheres e crianças iriam perder a vida das maneiras mais horripilantes que se possa imaginar.


 O Início da Inquisição
No entanto, pelo visto, aos olhos de Roma, nem todos os bispos eram suficientemente zelosos para descobrir os dissidentes. De modo que vários papas sucessivos mandaram delegados papais que, com a ajuda de monges cistercienses, tinham o poder de realizar suas próprias “inquirições” da heresia. Assim, por certo tempo, houve duas Inquisições paralelas, chamadas Episcopal e Delegada, esta última sendo mais severa do que a anterior.
Nem mesmo esta Inquisição Delegada, mais dura, bastava para os papas. O Papa Inocêncio III, em 1209, lançou uma cruzada contra os hereges do sul da França. Estes eram, na maioria, cataristas.
Chamada de “guerra santa”, a cruzada contra os albigenses terminou em 1229, mas nem todos os dissidentes foram mortos. Assim, naquele mesmo ano, no Sínodo de Toulouse, no sul da França, o Papa Gregório IX (foto), que reinou entre 1227 e 1241, deu novo estímulo à Inquisição.
Fez arranjos para haver inquisidores permanentes, incluindo um sacerdote, em cada paróquia. Em 1231, o  Papa promulgou um decreto pelo qual os hereges impenitentes seriam sentenciados à morte pelo fogo, e os arrependidos seriam condenados à prisão perpétua.
Dois anos mais tarde, em 1233, Gregório IX liberou os bispos da responsabilidade de achar hereges. Estabeleceu a Inquisição Monástica, assim chamada porque ele nomeou monges como inquisidores oficiais. Estes eram escolhidos mormente dentre os membros da Ordem Dominicana, recém-formada, mas também de entre os franciscanos.

O Processo Inquisitorial
O processo inquisitorial começava de maneira bizarra.
Os inquisidores, monges dominicanos ou franciscanos, juntavam os habitantes locais nas igrejas. Eram convocados ali para confessar alguma heresia, caso fossem culpados dela, ou para denunciar quaisquer hereges que conhecessem. Mesmo se suspeitassem de que alguém era herege, deviam denunciar tal pessoa.
Qualquer um — homem, mulher, criança, ou escravo — podia acusar qualquer pessoa de heresia, sem receio de se ver confrontado com o acusado, ou de, mais tarde, temer que o acusado saber quem o havia denunciado.
Os acusados não dispunham de alguém para os defender, visto que qualquer advogado ou testemunha em seu favor seria, ele próprio, acusado de ajudar e encobrir um herege. Assim, os acusados em geral se apresentavam sozinhos diante dos inquisidores, que eram, a um só tempo, promotores e juízes.
Os acusados dispunham, no máximo, de um mês para confessarem. Quer confessassem, quer não, começava a “inquisição” (do latim, inquisitio). Os acusados eram mantidos sob custódia, muitos em solitária com pouca comida, o que os deixava fragilizados. Quando os cárceres do bispo, situados geralmente dentro das igrejas, estavam repletos de pessoas, usava-se a prisão civil. E quando estas também ficavam superlotadas, convertiam-se prédios velhos em prisões.
Uma vez que se presumia que os acusados eram culpados, antes mesmo de começar o julgamento, os inquisidores utilizavam quatro métodos para induzi-los a confessar sua heresia. Primeiro, a ameaça de morte na estaca. Segundo, o confinamento em grilhões numa cela escura, úmida e reduzidíssima para morrerem de inanição. Terceiro, alguns visitantes lhes aplicavam pressão psicológica. E, por último, a tortura, que incluía o cavalete, a roldana, ou estrapada, e a tortura pelo fogo. Os monges ficavam do lado dos torturados que eram geralmente ajudantes nas igrejas, esperando qualquer confissão. Havendo uma "confissão" ou não, a absolvição estava descartada.

As Penalidades da Inquisição
Não haviam absolvições. As sentenças eram declaradas aos domingos, na igreja ou numa praça pública, na presença dos clérigos.
Uma sentença leve, dadas a alguns que "confessavam" seria de penitências. Todavia, estas incluíam o uso obrigatório de uma cruz amarela de feltro costurada nas roupas, o que tornava quase impossível a obtenção de emprego. Geralmente os apenados "mais leves" acabavam nas ruas e morriam como mendigos e ninguém os ajudava, porque tinham medo de serem presos por "ajudarem hereges".
A maioria das sentenças, entretanto, havendo ou não "confissões", seriam de açoites públicos seguidos de prisão perpétua, ou de serem entregues às autoridades seculares para a morte na fogueira.
É preciso levar em conta que estas "autoridades seculares" eram exercidas, na maioria dos casos, pelos próprios clérigos inquisidores, de maneira que é hipocrisia dizer que quem matava eram as autoridades e não a Igreja.

Os Inquisidores era ladrões Insaciáveis
Quaisquer que fossem, as penas vinham acompanhadas do confisco dos bens da pessoa condenada, que eram divididos entre a Igreja e o Estado. Em muitos casos os bens das pessoas ficavam com os próprios inquisidores. Os membros restantes da família dos "hereges" sofriam tremendamente, pois, de repente eram todos jogados na rua. As casas dos "hereges", e dos que os haviam abrigado, eram derrubadas.
Também, gente já morta, denunciada como herege, era julgada postumamente. Se considerados culpados, seus corpos, se possível, eram exumados e queimados, e suas propriedades, agora pertencentes aos herdeiros, eram confiscadas

Esse era o processo geral seguido pela Inquisição medieval. Podia variar em violência ou maldade, dependendo da ocasião e do local, mas era sempre letal às vítimas.

Violência Crescente
É interessante que o que se sabe sobre a Inquisição é baseado na documentação da própria Igreja, que fazia questão de registrar, muitas vezes em pormenores, o que fazia.
Em 1252, por exemplo, o Papa Inocêncio IV publicou sua bula Ad exstirpanda, autorizando oficialmente o emprego da tortura nos tribunais eclesiásticos da Inquisição, como se isso fosse a coisa mais natural. Regulamentos adicionais sobre o modo de utilizar a tortura foram promulgados, mais tarde, como um "refinamento da tortura", pelos Papas Alexandre IV (1254-1261), Urbano IV (1261-1264) e Clemente IV (1265-1268).
De início, não se permitia que os inquisidores eclesiásticos estivessem presentes quando os torturadores (que eram pessoas da igreja) aplicavam a tortura. Porém os Papas Alexandre IV e Urbano IV removeram tal restrição. Isto permitia que a “inquirição” prosseguisse nas chamadas "câmara de torturas", situadas no interior das Igrejas.
Na autorização original, a tortura só deveria ser aplicada uma vez, mas os inquisidores papais conseguiram contornar a situação por pretenderem que outras sessões de tortura eram simples “prosseguimento” da primeira sessão. Assim não havia limites para o número de vezes para que uma única pessoa pudesse ser torturada.
Dentro em pouco, até as testemunhas ou os denunciantes estavam sendo torturadas, para "certificar-se de que tinham denunciado todos os hereges que conheciam". A violência não parou e, não importando se um acusado se confessasse "herege" ou não era torturado do mesmo jeito. Segundo explica The Catholic Encyclopedia (Enciclopédia Católica), isto visava “obrigá-lo a testemunhar contra seus amigos e comparsas”. — Volume VIII, página 32.

Arma Contra o Pensamento Humano
 O mecanismo inquisitorial foi acionado na primeira metade do século 13 EC, para conforme dizem alguns hoje, apenas para "reconverter os cátaros". Mas ela não parou quando os cátaros foram extintos. Perdurou por vários séculos e foi usada para esmagar qualquer pessoa que falasse, ou sequer pensasse, de modo diferente da Igreja Católica. Isso espalhou o terror por toda a Europa católica.
Quando, perto do fim do século 15, a Inquisição começou a abrandar na França e em outros países da Europa Ocidental e Central, ela reacendeu, com força total, na Espanha., onde, de forma triste, se destacou Tomás de Torquemada, um frade dominicano e cruel inquisidor.
A Inquisição Espanhola, alavancada pelo Papa Sisto IV, em 1478, foi inicialmente dirigida contra os marranos, ou judeus espanhóis, e os mouros, ou muçulmanos espanhóis. A Igreja suspeitava que muitos deles adotaram a fé católica por simples medo, mas que continuavam a praticar em secreto sua religião original. Assim, por causa dessa suspeita, qualquer pessoa, mesmo os mais devotados católicos podiam ser presos, torturados e mortos.
Foi por esta época que começaram a surgir os protestantes - sacerdotes católicos que passaram a não mais ver como cristão, o modo como agia a Igreja. A Inquisição passou então a ser utilizada como arma, não só contra os próprios católicos, mas também contra os protestantes.

Seis Séculos de Terror
Da Espanha e de Portugal, a Inquisição espalhou-se para as colônias destas duas monarquias católicas, na América Central e do Sul, e para outras partes. E teria continuado até hoje se Napoleão Bonaparte não tivesse invadido a Espanha, no começo do século 19.
A igreja até tentou restaurar a Inquisição, depois da queda de Napoleão. Mas o mundo pós Napoleão havia mudado muito. O povo já não estava mais disposto a viver em guerra permanente contra tudo e contra todos conforme pretendia a igreja. Assim a Inquisição foi finalmente suprimida em 1834. Curioso é que ela não foi oficialmente terminada até hoje. Ainda existe o tribunal da Inquisição no Vaticano, com o pomposo nome de Congregação para a Doutrina da Fé - um nome que não faz jus ao que afirma ser, pois ela não doutrinou a fé de ninguém. Apenas matou.


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quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Os Cátaros

 Os Cátaros
Essa é a figura mais conhecida do Papa Inocêncio III, que reinou entre 1198 e 1216.
Mesmo reconhecendo que a corrupção da Igreja e do seu próprio clero foram  os culpados
pelo aparecimento de grupos dissidentes financiou contra estes uma sangrenta cruzada,
que assassinou em torno de 1 milhão de pessoas, inclusive católicas,
entre os anos de 1209 e 1229 DC.

Prólogo
Matem a todos eles; Deus reconhecerá os Seus.” Foi com essa frase que o frade Armaud Amalric, nomeado pelo Papa como Líder se dirigiu aos "cruzados" (uma espécie de exército da Igreja Católica) quando estes perguntaram como iriam "distinguir os católicos dos hereges".
Assim, naquele dia de verão, em 1209, foi massacrada a inteira população da cidade de Béziers, no sul da França, onde, ironicamente não só protestantes, mas católicos fervorosos também foram massacrados.
Historiadores católicos tentam atenuar a infame resposta, acima citada, alegando que ele disse aos cruzados somente "para rezar": “Não se preocupem. Acho que muito poucos [hereges] serão convertidos.”
Mas o fato é que, não importando qual a resposta exata, o resultado da "reza" foi a matança de pelo menos 20.000 homens, mulheres e crianças pelas mãos de um exército de 300.000 cruzados, chefiados por prelados da Igreja Católica.

O desenho ao lado, da época do cerco de Toulouse, durante a Cruzada Albigense, representa como eram realizados os ataques pelos cruzados. Ao cercarem uma cidade ou vilarejo, sem se preocuparem em separar os moradores segundo suas crenças, atacavam a todos indiscriminadamente, não importando se fossem mulheres ou crianças católicas. Lançavam pedras, fogo e pedaços de corpos humanos sobre os cidadãos, antes de invadirem e matarem os que sobrasse, alegando que "a cidade está sob controle dos hereges", o que na maioria dos casos não era verdade. Depois de "conquistarem" a cidade, saqueavam todos os bens dela.
O que provocou esse massacre horroroso? Lançada pelo Papa Inocêncio III contra os chamados "hereges" da província de Languedoc, no centro-sul da França. Antes de terminar essa cruzada, uns 20 anos mais tarde, possivelmente um milhão de pessoas — cátaros, valdenses e católicos — haviam perdido a vida.
Para responder a essa questão é preciso conhecer a época em que ela aconteceu.

A Realidade Religiosa da Época
O rápido aumento do comércio, no século 11 EC, trouxe consigo grandes mudanças nas estruturas socioeconômicas da Europa medieval. Surgiram cidades para abrigar o crescente número de artesãos e mercadores. Isto deu margem a novas idéias.
A dissensão religiosa arraigou-se em Languedoc, onde prosperava uma civilização notavelmente mais tolerante e avançada do que em outros lugares da Europa. A cidade de Toulouse, em Languedoc, era a terceira metrópole mais rica da Europa.
Era o mundo em que prosperavam os trovadores, cujos poemas, entre outras coisas, às vezes aludiam a assuntos políticos e religiosos.
Descrevendo a situação religiosa nos séculos 11 e 12, a Revue d’histoire et de philosophie religieuses declara: “No século 12, como no século anterior, a moral do clero, sua opulência, sua venalidade e sua imoralidade continuavam a ser questionadas, mas acima de tudo se criticavam sua riqueza e seu poder, seu conluio com as autoridades seculares e sua subserviência.”

O que aconteceu? Começaram a surgir grupos, como os Cátaros e os Valdenses, que pensavam diferente do que a Igreja Católica queria. E a culpa era da própria Igreja.
O próprio Papa Inocêncio III reconheceu que se devia à corrupção prevalecente dentro da Igreja a culpa pelo crescente número de dissidentes, pregadores itinerantes na Europa, em especial no sul da França e no norte da Itália. Ele repreendeu os sacerdotes por não instruírem o povo, dizendo: “Os filhos têm falta de pão, que vós não quereis repartir com eles.”
No entanto, mesmo reconhecendo o erro, em vez de promover a reeducação bíblica do povo, em favor do catolicismo o Papa Inocêncio III afirmou que “a profundeza da Escritura divina é tal, que não somente os simples e iletrados, mas até mesmo os prudentes e os instruídos, não são plenamente capazes de tentar entendê-la”.
A leitura da Bíblia foi então proibida a todos, exceto para os clérigos e apenas em latim.

Para contra-atacar a pregação itinerante dos dissidentes, o Papa aprovou a fundação da Ordem dos Frades Pregadores, ou Dominicanos.
Em contraste com o opulento clero católico, esses frades seriam pregadores viajantes, comissionados a defender a ortodoxia católica contra os “hereges” no sul da França. O papa enviou também legados papais para argumentar com os cátaros e para tentar "trazê-los de volta" ao aprisco católico.
Evidentemente estes esforços falharam. Além disso um dos legados foi morto, supostamente por um herege, Inocêncio III então ordenou em 1209 a Cruzada Albigense. Albi era uma das cidades onde os cátaros eram especialmente numerosos, de modo que os cronistas da Igreja chamavam os cátaros de albigenses e usavam o termo para designar todos os “hereges” daquela região, inclusive os valdenses.


Quem Eram os Cátaros E Quais Suas Crenças?

A palavra “cátaro” deriva da palavra grega ka·tha·rós, que significa “puro”.
Do século 11 ao século 14, o catarismo espalhou-se especialmente na Lombardia, no norte da Itália, e em Languedoc.
As crenças dos cátaros eram uma mistura de dualismo oriental e de gnosticismo, talvez importadas por mercadores e missionários estrangeiros. The Encyclopedia of Religion define o dualismo cátaro como crença em “dois princípios: um bom, que governa tudo o que é espiritual, o outro, mau, responsável pelo mundo material, inclusive pelo corpo do homem”.
Os cátaros acreditavam que Satanás criou o mundo material, irrevogavelmente condenado à destruição.
A esperança dos cátaros era escapar do mundo mau, material.

Os cátaros estavam divididos em duas classes, os Perfeitos e os Crentes. Os Perfeitos eram iniciados com um rito de batismo espiritual, chamado consolamentum. Este era realizado pela imposição de mãos, após um ano de provação. Achava-se que este rito liberava o postulante do domínio de Satanás, purificando-o de todos os pecados, e conferia-lhe o espírito santo. Isto deu origem ao termo “perfeitos”, aplicado aos da relativamente pequena elite que atuava como ministros para os crentes. Os perfeitos faziam votos de abstinência, castidade e pobreza. Se fosse casado, o perfeito tinha de abandonar o cônjuge, visto que os cátaros acreditavam que o pecado original foi a relação sexual.

Os demais eram os Crentes, pessoas que não adotavam um estilo de vida ascético, embora aceitassem os ensinos cátaros. Ajoelhando-se em honra dos perfeitos, num rito chamado melioramentum, o crente solicitava perdão e uma bênção. A fim de se habilitarem para levar uma vida normal, os crentes faziam com os perfeitos uma convenenza, ou acordo, que previa a administração do batismo espiritual, ou consolamentum, no leito de morte.


Como os Cátaros Encaravam a Bíblia?
Embora os cátaros citassem extensamente a Bíblia, encaravam-na principalmente como fonte de alegorias e de fábulas. Achavam que a maior parte das Escrituras Hebraicas procedia do Diabo.
Usavam partes das Escrituras Gregas, tais como os textos que contrastavam a carne com o espírito, para reforçar sua filosofia dualista. Por exemplo, na oração do Pai-Nosso, eles pediam o “nosso pão supersubstancial” (ou seja, “pão espiritual”), em vez de “o pão nosso de cada dia”, já que consideravam o pão material um mal necessário.
Muitos ensinos cátaros estavam em contradição direta com a Bíblia. Por exemplo, eles acreditavam na imortalidade da alma e na reencarnação. Baseavam também suas crenças em textos apócrifos.
Não obstante, no que se refere às partes das Escrituras traduzidas pelos cátaros para o vernáculo, até certo ponto tornaram a Bíblia um livro mais bem conhecido na Idade Média.


Não Eram Cristãos.
Os perfeitos achavam que eram os sucessores legítimos dos apóstolos, de modo que se chamavam de “cristãos”, enfatizando isso por acrescentar nesse título os termos “verdadeiros” ou “bons”.
Na realidade, porém, muitas crenças cátaras eram alheias ao cristianismo. Embora os cátaros reconhecessem a Jesus como o Filho de Deus, rejeitavam o fato de ele ter vindo em carne, bem como seu sacrifício resgatador.
Interpretando erroneamente a condenação bíblica da carne e do mundo, acreditavam que toda a matéria se originou do mal. Por isso, sustentavam que Jesus só podia ter tido um corpo espiritual e que, enquanto na terra, apenas parecia ter um corpo carnal.
Iguais aos apóstatas do primeiro século, os cátaros eram ‘pessoas que não confessavam Jesus Cristo vindo na carne’.

M. D. Lambert, no seu livro Heresia Medieval, escreve que o catarismo “substituiu a moralidade cristã por um ascetismo compulsório, . . . eliminou a redenção por se negar a admitir o poder salvador da [morte de Cristo]”.  O catarismo acha que “as verdadeiras afinidades dos perfeitos estavam com os instrutores ascéticos do Oriente, os bonzos e os faquires da China ou da Índia, os adeptos dos mistérios órficos ou os instrutores do gnosticismo”.
Na crença cátara, a salvação não dependia do sacrifício resgatador de Jesus Cristo, mas do consolamentum, ou do batismo no espírito santo. Para os assim purificados, a morte resultaria em serem libertados da matéria.


Reação Violenta  da Igreja
O povo comum, cansado das exigências extorsivas e da generalizada decadência do clero que, como já vimos foi reconhecida pela própria Igreja, sentiu-se atraído pelo modo de vida dos cátaros. Os perfeitos, por causa da corrupção da Igreja, a identificavam juntamente com sua hierarquia como sendo a “sinagoga de Satanás” e “a mãe das meretrizes”, de Revelação (Apocalipse) 3:9 e 17:5.
A doutrina dos cátaros prosperava e suplantava a Igreja no sul da França. Observando essa prosperidade, a reação do Papa Inocêncio III foi lançar e financiar a chamada Cruzada Albigense, a primeira cruzada organizada dentro da cristandade contra pessoas que afirmavam ser cristãs mas não católicas. Como se deu o lançamento dessa cruzada?
Por meio de cartas e de legados, o papa importunou reis, condes, duques e cavalheiros católicos da Europa. Prometeu indulgências e, principalmente as riquezas de Languedoc a todos os que lutassem para erradicar a heresia “de qualquer modo”.
Essa "convocação" do Papa (na verdade um contrato financeiro entre um patrão [o Papa] e assassinos [os cruzados]) não deixou de ser atendida. Chefiado por prelados e frades católicos, um exército misto de cruzados  inescrupulosos, nem sempre católicos mas movidos por puro sadismo e ganância, procedentes do norte da França, de Flandres e da Alemanha, dirigiu-se ao sul, ao vale do Ródano. O resultado ia ser trágico e nada cristão.


Holocausto Católico
A destruição de Béziers marcou o início de uma guerra de conquistas, roubos e saques que destruiu Languedoc numa orgia de fogo e de sangue. Albi, Carcassonne, Castres, Foix, Narbonne, Termes e Toulouse caíram todas diante dos sanguinários cruzados. Em baluartes cátaros, tais como Cassès, Minerve e Lavaur, centenas dos Perfeitos foram queimados na estaca. Segundo o frade-cronista Pierre des Vaux-de-Cernay, os cruzados, ‘com alegria de coração, queimaram vivos os perfeitos’.
Dentro da Igreja de Sta. Maria Madalena em Béziers, por exemplo, foram massacrados 7 mil homens mulheres e crianças.
Em 1229, depois de 20 anos de lutas e devastações, Languedoc passou a ficar sob a coroa católica francesa. Parecia que os "hereges" foram totalmente exterminados. Mas a matança ainda não havia terminado.


Surge o Monstro da Inquisição
Em 1231, o Papa Gregório IX instituiu a Inquisição papal, a fim de dar apoio à luta armada. No início, o sistema inquisitorial baseava-se em denúncias e em coações; mais tarde, em torturas sistemáticas.
Seu objetivo era "erradicar aquilo que a espada não havia conseguido destruir", a saber: o pensamento das pessoas.
 Os juízes da Inquisição — na maioria frades dominicanos e franciscanos — estavam sujeitos a prestar contas apenas ao papa. A punição oficial por heresia era a morte por ser queimado na estaca em praça pública.Qualquer um podia ser considerado "herege", mesmo os católicos mais fervorosos.
O fanatismo e a brutalidade dos inquisidores foram tais, que irromperam revoltas em Albi e em Toulouse, e em outros lugares. Em Avignonet, todos os membros do tribunal inquisitorial foram massacrados. Isso não acabou com a Inquisição que, pelo contrário iria se tornar bem pior.

O Fim dos Cátaros
Em 1244, a rendição da 'montanha-fortaleza' de Montségur (foto), último refúgio de muitos Perfeitos, foi o golpe mortal aplicado à doutrina dos cátaros. Cerca de 200 homens e mulheres pereceram queimados em massa, em estacas. No decorrer dos anos, a Inquisição caçou os cátaros remanescentes e escondidos. O último supostamente julgado como cátaro foi queimado na estaca em Languedoc, em 1330. O livro Medieval Heresy menciona o fato da seguinte maneira : “A queda do albigensismo foi a principal medalha da Inquisição.”


Um Crime Sem Justificativa Cristã
Os cátaros estavam longe de ser verdadeiros cristãos. Mas será que somente criticarem a Igreja Católica justificava seu extermínio cruel por pretensos cristãos? Será que, por escolherem um modo de vida diferente justificava serem mortos de maneira horrenda? Não. Não há justificativa para matar por causa da fé. Com efeito, os perseguidores e assassinos católicos dos catáros desonraram, renegaram a Deus e a Cristo, e difamaram o verdadeiro cristianismo, por torturar e massacrar essas dezenas de milhares de seus próprios dissidentes.



terça-feira, 9 de setembro de 2014

A Igreja e o Holocausto

A Igreja e o Holocausto
20 de julho de 1933. Pacelli, então colaborador do Papa Pio XI, assina a "Reichskonkordat", que unia
a Igreja Católica e o nazismo alemão em caráter oficial. Esse vergonhoso "acordo",
semelhante ao que Hitler assinaria mais tarde com Stalin, garantia entre outras coisas
que os católicos alemães apoiariam Hitler em tudo, inclusive na perseguição aos judeus.
Na foto, da esquerda para a direita vemos: O padre alemão Ludwig Kaas
o Vice-Chanceler Franz Von Papen, o Cardeal italiano Giuseppe Pizzardo, Pio XII, o 
Cardeal italiano Alfredo Ottaviani e o então Ministro do Interior alemão Rudolf Buttmann.


Prólogo
O holocausto foi, não só o genocídio de 6 milhões de  judeus durante a 2ª guerra mundial. Foi também o massacre em massa de milhões de pessoas, indiscriminadamente, totalizando redondos 15 milhões (20 milhões segundo certas fontes) somente nos mais de 20 mil campos de morte. Fora dos campos haviam também os mais de 1,5 milhão de mortos pelos Einsatzgruppen, comandos de caça e assassinato em massa não só de judeus mais de qualquer "opositor" ao regime nazista. Essa alegada  "oposição ao nazismo" era bizarra já que até bebês eram massacrados com essa justificativa. Ao todo, crê-se que mais de 30 milhões de pessoas tenham sido assassinadas dentro das fronteiras do III Reich entre 1933 e 1945.
O que tornou possível essa gigantesca empreitada? Foi o apoio - por vezes entusiástico - de todos os setores da sociedade alemã, inclusive o religioso. Com certeza milhões de pessoas trabalharam ativa ou indiretamente nesse morticínio e essas pessoas não eram alheias a religião. A Alemanha da época era um país essencialmente católico, mas também haviam as igrejas protestantes. 
Assim se pergunta: Como foi possível que as religiões do país não se opuseram à um projeto de monstruoso barbarismo em pleno Século XX?

Nos dias atuais esse assunto, longe de estar esgotado, suscita curiosidade. As vezes grupos se levantam com fortes evidências da participação ativa da Igreja Católica no morticínio. 1987 foi um desses anos críticos para a igreja. Como ela reagiu?
A Igreja Católica preparou um documento em que reconheceria sua responsabilidade no Holocausto. De modo que havia grande expectativa quando, em março de 1998, a Comissão do Vaticano para Relações Religiosas com os Judeus divulgou o documento intitulado Nós nos recordamos: uma reflexão sobre a Shoah. 
Tal documento seria um formal pedido de desculpas. Mas embora alguns tenham gostado do documento, muitos ficaram descontentes com seu conteúdo. Por quê?

Pedido de Desculpa ou Não?
O documento do Vaticano faz uma distinção entre anti-judaísmo, do qual a Igreja se declara culpada, e anti-semitismo, do qual ela se declara inocente. Muitos acham tanto essa distinção como a conclusão que se tira dela insatisfatórias. O rabino alemão Ignatz Bubis disse: “Para mim parece um modo de dizer: ‘Não foi nossa culpa; a culpa é de outro.’”
Embora o historiador católico italiano Giorgio Vecchio concorde com a distinção entre anti-judaísmo e anti-semitismo, ele indica que “o problema também é entender como o anti-judaísmo católico pode ter contribuído para o desenvolvimento do anti-semitismo”. 
É interessante que o jornal L’Osservatore Romano, jornal católico do Vaticano, de 22-23 de novembro de 1895, publicou uma carta que declarava: “Qualquer católico sincero é, em essência, anti-semita; e também os clérigos o são, por força da doutrina e ministério.”. 
De maneira que o documento "pedido de desculpa" era confuso. Como pode alguém ter sido anti-semita dentro do nazismo e ao mesmo tempo ser inocente na perseguição ao judeus?
Mas a parte do documento do Vaticano que provocou as maiores críticas, porém, não foi esta. Foi a defesa das ações de Pio XII, nomeado papa às vésperas da Segunda Guerra Mundial, em março de 1939. Ele havia servido como núncio (embaixador do papa) na Alemanha de 1917 a 1929. 


O Vergonhoso Silêncio de Pio XII 
O jurista italiano Francesco Margiotta Broglio não acha que o documento “ofereça elementos novos ou explicações sobre a amplamente debatida questão do chamado ‘silêncio’ do Papa Pio XII, sobre sua alegada afinidade com os alemães e sobre suas ações diplomáticas em relação ao regime nazista tanto antes como durante o papado”.
A maioria dos comentaristas concorda que, independentemente de como se encara o teor do documento We Remember, a questão sobre por que os líderes da Igreja Católica permaneceram em silêncio quanto ao genocídio nos campos de concentração nazistas “permanece em aberto”.
Segundo o historiador norte-americano George Mosse, quando escolheu o silêncio Pio XIIsalvou a Igreja, mas sacrificou sua mensagem moral. Ele se comportou como um chefe de Estado, não como um papa”. Observadores bem-informados do Vaticano acreditam que o que atrasou a divulgação do documento foi a dificuldade de abordar a relação de Pio XII com o Holocausto.
Sem dúvida até a Igreja reconhece, mesmo que indiretamente, que o silêncio foi, na verdade, um apoio.

Defesa Infundada
Alguns hoje defendem a fraca tese de que, ao silenciar-se "o Papa evitou mais destruição", pois caso protestasse, os nazistas poderiam destruir o Vaticano ou "perseguir os católicos". Até o papa Paulo VI, insistiu que “uma atitude de protesto e de condenação não só teria sido fútil, mas também prejudicial”. Tal tese porém constitui um duplo tiro no pé da Igreja. Primeiro porque atesta a falta de fé em Deus, sucumbida por medo à Hitler. Segundo porque o exército nazista era essencialmente católico. Eram católicos os que estavam perpetrando os massacres e, certamente uma palavra do Papa contra o crime traria, não "mais destruição", mas a diminuição do crime, pois os assassinos de orientação católica certamente dariam ouvidos ao seu líder religioso.
Assim a defesa que o documento faz do Papa Pio XII irritou a muitos. “É desapontador o silêncio desse documento em relação ao ‘silêncio do papa’”, escreveu Arrigo Levi. Elie Wiesel, ganhador do Prêmio Nobel da Paz, em 1986, disse: “Parece-me que afirmar que nós, judeus, devemos ser gratos a Pio XII é, no mínimo, heresia.” 

A Culpa é dos Outros Mesmo Sendo Nossa.
O confuso e irritante documento vai além. Também adota a distinção tradicional dos teólogos católicos, segundo a qual a Igreja como instituição é santa e mantida sem erro por Deus, ao passo que seus membros, que são pecadores, são culpados por quaisquer males perpetrados. 
A comissão do Vaticano escreveu: “Outros cristãos não demonstraram resistência espiritual e ações concretas que seriam de se esperar de seguidores de Cristo. . . . Não foram suficientemente fortes para erguer a voz em protesto. . . . Lamentamos profundamente os erros e as falhas desses filhos e filhas da Igreja.”
De maneira que, embora não admita o documento reconhece como "fraqueza" o silêncio do Papa Pio XII.
E também atribuir a culpa aos membros individuais da Igreja em vez de à Igreja, como instituição, representada por um Papa "fraco", pareceu para a maioria como um grande retrocesso, em comparação com outros pedidos explícitos de perdão. 
Por exemplo, a Igreja Católica Romana na França emitiu uma “Declaração de Arrependimento” formal, pedindo perdão a Deus e ao povo judeu pela “indiferença” que a Igreja Católica demonstrou para com a perseguição aos judeus sob o governo marcial da França, em Vichy. 
Numa declaração lida pelo arcebispo Olivier de Berranger, a Igreja admitiu ter permitido que seus próprios interesses “obscurecessem o dever bíblico de respeitar todo ser humano criado à imagem de Deus”.
A declaração francesa mencionava em parte: “A Igreja tem de reconhecer que, no que se refere à perseguição dos judeus e especialmente às diversas medidas anti-semíticas decretadas pelas autoridades de Vichy, houve muito mais indiferença do que indignação. A regra era o silêncio, e palavras a favor das vítimas, a exceção. . . . Hoje, confessamos que o silêncio foi um erro. Reconhecemos também que a Igreja da França falhou na sua missão de educadora da consciência das pessoas.”
Esse pedido de desculpas por parte da Igreja Católica Francesa foi reconhecido pelo Vaticano. Mas daí se pergunta: Como pode o Vaticano, que fez a mesmíssima coisa, se calando, reconhecer o erro da sua filial, a Igreja Católica Francesa, e não ter a mesma atitude?


O Fracasso Moral da Igreja
A controvérsia sobre o silêncio de Pio XII diante das atrocidades nazistas durante a Segunda Guerra Mundial persiste de forma intermitente já por décadas. 
Os críticos, em geral, afirmam que um protesto papal aos nazistas poderia ter salvo milhões de vidas. 
Mas, por que levantar esse assunto de novo? Não é apenas agitar uma questão morta? Não. O próprio Vaticano a mantém viva. Em face desse assunto, as autoridades até mesmo puseram de lado a política de esperar 50 anos para a publicação de documentos dos seus arquivos. 
A igreja tem que fazer algo com relação aos críticos, porque compreende que, a menos que as pessoas "entendam" o que aconteceu, eles, os críticos, possuem poderosíssimo argumento para ilustrar o fracasso moral da Igreja.
Assim, muitos membros sinceros da Igreja querem saber a resposta. Sabem que até mesmo o falecido Papa Paulo VI, defensor do silêncio papal e portanto também fracassado moralmente estava também envolvido nos assuntos, lá naquele tempo, como auxiliar íntimo de Pio XII. Assim, uma comissão jesuíta publicou documentos selecionados dos arquivos do Vaticano desde 1965. 
Um deles, intitulado “A Santa Sé e as Vítimas de Guerra”, saiu em abril de 1974. Fornece ele quaisquer novos vislumbres sobre essa questão? 


Uma Questão Mais Profunda 
O exército de assassinos nazistas era quase que totalmente católico. E o crime deles só foi possível graças ao fracasso de sua própria Igreja em doutriná-los contra esse tipo de ação.
Pois despachos noticiosos colocam na berlinda a evidência documental de que o Vaticano recebera muitas informações sobre as atrocidades nazistas desde que estas começaram. 
Muito mais significativo, porém, é outro item pouco notado. Mostra que um dos auxiliares em quem Pio XII muito confiava levantou uma questão que penetra muito mais a fundo do que a pergunta de por que o papa não falou abertamente contra os nazistas. O “MonsenhorDomenico Tardini (mais tarde um cardeal), segundo se relata, perguntou exasperado, naquela época:
Todo o mundo entende que a Santa Sé não pode fazer com que Hitler se comporte. Mas, que não consiga manter um sacerdote sob controle — quem pode entender isto?”
Se a igreja não conseguiu manter seus próprios sacerdotes - e a bem dizer, o próprio Papa - livre de culpa do crime nazista, como iria manter "comportado" o seu povo católico?
Mas o inútil debate quanto ao bem que a voz de Pio XII teria causado quase que obscureceu por completo esta questão muito mais fundamental. 


Os cristãos honestos se vêem obrigados a confrontar essa questão: Como poderiam as atrocidades nazistas vir sequer a ser cometidas em primeiro lugar, se não fosse a cooperação do povo católcio e de seus líderes espirituais? 
95% dos alemães naquele tempo eram religiosos. Ou eram católicos ou eram protestantes. Quase 32 milhões, mais de 40% da população, eram católicos, bem como quase toda a população dos aliados europeus da Alemanha, a Áustria e a Itália. 
Mesmo entre as temidas S.S, aqueles que perpetravam os assassinatos também em mulheres e crianças, quase 1/4 deles ainda eram "católicos praticantes" frequentadores das "missas de campo" em 1939, apesar das pressões da liderança das S.S, que, temendo o contraste instavam para que desistissem disso.
O próprio Pio XII expõe essa mesma questão numa carta particular, recentemente publicada, ao sacerdote que provocou o exaspero do “Mons.” Tardini. Como presidente, o sacerdote Josef Tiso dominava o protetorado nazista da Eslováquia durante toda a guerra (1939-45). Pio escreveu ao “Monsenhor” Tiso que ele esperava que o governo e o povo eslovacos, “quase que inteiramente católicos, jamais executassem a remoção à força de pessoas que pertenciam à raça judaica”. E o fato de que “tais medidas são executadas entre um povo de grandes tradições católicas, por um governo que declara que é seu seguidor e depositário”, o angustiava grandemente. — 7 de abril de 1943.

Mas, como podia haver qualquer forma de cooperação com o programa nazista de exterminação racial chegar sequer a ser considerado entre um povo que o próprio papa disse ser quase que inteiramente católico e de grandes tradições católicas'’?
Por certo, os ensinamentos morais da Igreja tornariam inimaginável que o “Mons.” Tiso e seu rebanho tivessem qualquer parte no genocídio! Todavia a História mostrou o contrário. 
De maneira que os membros de coração honesto da Igreja certamente desejam uma explicação de tal conduta, bem como a das outras chamadas nações “cristãs” envolvidas com os nazistas.
O próprio Cardeal Eugène Tisserant do Vaticano fornece uma razão, com a franqueza duma carta particular, a um amigo. 
Depois da queda da França em 1940, escreveu queixando-se ao Cardeal Suhard, de Paris, que “a ideologia fascista e o hitlerismo transformaram as consciências dos jovens, e os com menos de trinta e cinco anos dispõem-se a cometer qualquer crime para qualquer propósito ordenado por seu líder”. 
Mas, como poderiam estas consciências treinadas pela Igreja ser tão facilmente ‘transformadas’? Afinal de contas, Hitler só estava operando sobre elas por cerca de sete anos, ao passo que a Igreja estava treinando seu rebanho por quase 2 mil anos! 


O Covarde Silêncio Papal Foi Até Previsto
Por certo, o Papa Pio XII poderia ter feito algo quando os nazistas invadiram o "território tradicional" da Igreja — a consciência humana! Mas, lamenta o Cardeal Tisserant:
Desde o início de novembro [de 1939], tenho solicitado com persistência à Santa Sé que proclame uma encíclica sobre o dever do indivíduo de obedecer aos ditames da consciência, porque este é o ponto vital do cristianismo.”
No entanto, a história não revela nenhuma declaração papal durante a guerra sobre este “ponto vital do cristianismo”. Com efeito, Tisserant passou a fazer a melancólica previsão: “Receio que a história possa ter razão em repreender a Santa Sé por ter seguido uma política de conveniência para si mesma, e muito pouco além disso. Isto é extremamente triste.”
Sem dúvida, a covarde e medrosa “política” do cuidado diplomático do papa ao lidar com os nazistas deveras assegurou a “conveniência” da sobrevivência do Vaticano e da Igreja. O próprio Pio XII aconselhou os bispos alemães que “o perigo de represálias e pressões”, ou, algo pior ainda, exigiam “conter-se” em seus pronunciamentos “a fim de evitar maiores males. Este é um dos motivos”, escreveu ele, “para as limitações” que impôs às suas próprias declarações. — 30 de abril de 1943.
Esta explicação nos ajuda a entender por que Pio XII se conduziu tão cuidadosamente. Mas, deixa inexplicado o seguinte: Por que ministros, sacerdotes e seus rebanhos se dispuseram a testemunhar, cooperar, ou, na realidade, em cometer as atrocidades nazistas — quase que até o último deles? O que aconteceu com suas consciências? 


A Consciência Católica Submissa à Guerra.
A resposta tem de residir no treinamento recebido por tais consciências. 
Como um católico leal, por exemplo, deveria entender a carta pastoral do próprio Pio XII, de 8 de dezembro de 1939, chamada Asperis Commoti Anxietatibus, dirigida aos capelães nos vários exércitos das nações em guerra, mais de 500 deles servindo no exército de Hitler
Instou com os capelães de ambos os lados que tivessem confiança em seus respectivos bispos militares, considerando a guerra qual manifestação da vontade dum Pai celeste que sempre transforma o mal em bem, e, “como combatentes sob as bandeiras de seu país, lutem também pela Igreja”.
Esta contradição desconcertante é novamente demonstrada pelas cartas do papa aos bispos em ambos os lados. Numa carta de 6 de agosto de 1940 aos bispos germânicos, Pio XII expressou sua admiração pelos católicos que “leais até à morte, dão prova de sua disposição de partilhar os sacrifícios e sofrimentos dos outros Volksgenossen [co-alemães]”.
Apenas nove meses antes, o papa dirigira similar mensagem aos bispos franceses, aconselhando-os de que tinham direito de apoiar todas as medidas para defender seu país contra esses mesmos católicos alemães “leais”!  Os metropolitas da Igreja italiana receberam conselhos similares pouco antes de a Itália juntar-se à guerra contra os Aliados.
O Papa apoiava a guerra mortal entre os soldados católicos. Católicos alemães contra católicos franceses e vice-versa, desde que 'continuassem católicos'. Não é isso uma submissão católica aos governos políticos ao invés de serem submissos às Igrejas?
Assim, quando o chefe da Igreja realmente falou sobre assuntos relativos à consciência, como o fizeram quase todos os seus clérigos, ele aplaudiu as consciências daqueles que serviam ‘lealmente’ nas forças militares de qualquer tipo ou nação. Com efeito, quando o correspondente do Vaticano em Berlim do jornal oficial, L’Osservatore Romano, perguntou certa vez a Pio XII se protestaria contra o extermínio dos judeus, o papa lhe disse que “não poderia esquecer que milhões de católicos servem nos exércitos germânicos. Devo conduzi-los a conflitos de consciência?” 



Os Evangélicos Nazistas.
Foram os eclesiásticos protestantes menos responsáveis? Não. Note o que o Conselho Eclesiástico da Igreja Evangélica (Luterana) Alemã, o maior corpo protestante, telegrafou pessoalmente a Hitler, em 30 de junho de 1941:
Que o Deus Onipotente auxilie V. Ex.a e a nossa nação contra o inimigo duplo [Grã-Bretanha e a Rússia]. A vitória será nossa, e ganhá-la deve constituir o ponto principal em nossas aspirações e ações. . . . em todas as suas orações [a Igreja] está com V. Ex.a, e com nossos incomparáveis soldados que agora estão prestes a eliminar a raiz desta pestilência, mediante duros golpes.” 
Mas "inimigo duplo" também consistia de soldados protestantes. De maneira que, da mesma forma que os católicos, protestantes alemães guerrearam contra protestantes de outros países às instâncias de seus líderes religiosos. .
Certamente, inebriados com os repetitivos discursos de Hitler sobre a eliminação do judaísmo como a raiz dos males do mundo”, desde antes de sua posse ao poder, os protestantes também sabiam do que se estava tratando quando começasse o massacre.
Com a orientação de seus pastores, o que mais poderiam os rebanhos protestantes fazerem? Lamentavelmente o que fizeram fala por si.

Apoio Voluntário à Hitler
As igrejas protestantes, a exemplo da católica, apoiaram Hitler mesmo que este não as tenha chamado.
Hitler jactava-se zombeteiramente de que “os párocos . . . trairão seu Deus a nós. Trairão qualquer coisa a bem de seus miseráveis empreguinhos e rendas. . . . Por que devemos discutir? Engolirão qualquer coisa de modo a manter suas vantagens materiais.” (O governo de Hitler continuou a dar grandes subsídios estatais às principais igrejas durante toda a guerra)
Para sublinhar a realidade do que Hitler afirmava sobre as igrejas, a pessoa só precisa perguntar a si mesma: “Se eu fosse sincero membro duma igreja na Alemanha, na Áustria, ou na Itália (o que significaria não ter participação em genocídios e assassinatos), durante esse período, o que me teriam aconselhado meus líderes espirituais — e o que eu teria feito?” Suponhamos que dissesse: “Não teria servido a Hitler.” O que teria enfrentado, não da parte dos nazistas, mas de seus próprios líderes espirituais? 
Se as Igrejas, através de seus líderes estavam apoiando abertamente Hitler, como os seus fieis frequentadores comuns poderiam estarem contra ele?

Apenas 1 Entre  32 Milhões
Não importou quanto procurasse, o erudito e educador católico, Gordon Zahn, só conseguiu encontrar evidência documentada de um único dentre 32 milhões de católicos alemães que se recusou por motivo de consciência a servir nos exércitos de Hitler
Além dos eclesiásticos perseguidos por oposição política aos nazistas, ele encontrou um total de apenas sete pessoas, entre as inteiras populações da Alemanha e da Áustria, que por motivo de consciência se recusaram a fazer o juramento militar. Talvez fique imaginando por que foram tão poucos. 
Zahn responde que suas extensivas entrevistas com pessoas que conheciam estes homens produziram “garantia positiva, expressa por quase todo informante, de que qualquer católico que se decidisse a recusar o serviço militar não teria recebido nenhum apoio, fosse ele qual fosse, de seus líderes espirituais”. 
Ironicamente, aqueles poucos que deveras o recusaram, apegando-se a isso, eram realmente um embaraço, não para o estado, mas para seus “líderes espirituais”.

Juramento Nazista = Dever Cristão?
Como pode um fiel, católico ou protestante, ter se recusado a servir Hitler, se seus próprios líderes religiosos lhe diziam que isso era um "dever cristão"?
Por exemplo, ao solicitar clemência do tribunal nazista para um sacerdote que se recusara, o Arcebispo Konrad Groeber, de Freiburg, escreveu que o sacerdote era “um idealista que crescera cada vez mais distanciado da realidade. . . . que desejava ajudar seu Volk e sua Vaterland, mas que agia segundo premissas erradas”. A outros se negou a comunhão, por parte de capelães das prisões, por violarem seu “dever cristão” de fazer o juramento militar nazista.

Bispos Aconselham o Juramento  Nazista
O caso documentado dum camponês austríaco, Franz Jägerstätter, ilustra o que um membro duma igreja realmente enfrentava da parte de seus líderes espirituais. Jägerstätter foi finalmente encarcerado por sua posição, em Linz, Áustria, e mais tarde decapitado. 
O capelão católico da prisão escreve que ele “tentara deixar claro que ele tinha de ter em mente seu próprio bem-estar, e o de sua família, mesmo ao seguir seus ideais e princípios pessoais”. O capelão lamentou que “Ele parecia ter vindo a entender meu ponto e prometeu seguir minha recomendação e fazer o juramento [militar nazista]”.
Vinha este conselho dum nazista? Não — vinha dum sacerdote que permaneceu em boa posição por muito tempo depois da guerra! Mas, essa não era a única pressão da parte dos líderes espirituais. 
O bispo Fliesser, da mesma diocese de Linz, revela que ele, também “conhecera pessoalmente Jägerstätter”, e argumentara “em vão” que Jägerstätter não era responsável “pelas ações da autoridade civil [nazista]”. Disse o bispo que o caso dele era “um caso inteiramente excecional, um caso a ser mais admirado do que copiado”. O Bispo Fliesser escrevia a um sacerdote depois da guerra, explicando a sua recusa em permitir a publicação da história de Jägerstätter no jornal diocesano de Linz. A história poderia “criar confusão e perturbar consciências”, disse ele.
Assim, o Bispo Fliesser considerava o homem que seguira sua consciência como ‘caso excecional’ — e não devendo ser copiado. “Considero maiores heróis aqueles exemplares jovens católicos, seminaristas, sacerdotes, e chefes de famílias, que lutaram e morreram no cumprimento heróico do dever”, continuou. 
Até mesmo o advogado Feldmann, designado pelo tribunal nazista, usou este argumento na tentativa de fazer com que Jägerstätter transigisse, mencionando que os milhões de católicos, inclusive os clérigos, empenhavam-se no combate com consciência “limpa”. Por fim, recorda Feldmann, desafiou-o a citar um único caso em que um bispo de qualquer modo desencorajasse o serviço militar nazista. 
Ele não conhecia nenhum. 

A igreja FalhouEm face de tais fatos históricos, os cristãos refletivos têm de perguntar: Por que uma organização, com todos os recursos e tendo bem mais de mil anos para treinar as consciências dos fiéis só conseguiu produzir a evidência de um único católico alemão dentre 32 milhões (0,000003 por cento) cuja consciência não lhe permitiria lutar em favor dos nazistas? 
Não estavam os católicos e os protestantes que serviram a Hitler sob o mesmo “mandamento bíblico”? Alegadamente sim, estavam. Seus líderes espirituais conheciam a lei de Deus. Todavia, como disse Jesus:
Quão engenhosamente contornais o mandamento de Deus a fim de preservar vossas próprias tradições!” — Marcos 7:9, Versão bíblica Jerusalem Bible, católica.
A Igreja falhou. Não obedeceu o mandamento que ela própria prega e nem conseguiu que seu povo obedecesse.

Hoje, 70 anos após a terrível tragédia da Shoah, ou Holocausto, a Igreja Católica ainda não conseguiu se reconciliar com seu passado: um passado de ambiguidade e silêncio, para se dizer o mínimo.

A Igreja Continua a Mesma.
Imagina você que a igreja mudou com o tempo? Ela está mais apegada agora às normas cristãs, que antes?   Não. Ela não mudou. Ela continua transigindo de forma oficial, mesmo que as vezes tente "se desculpar" pelos erros do passado.
Pode observar por si mesmo, mediante o exposto nesse artigo, “quão engenhosamente” os hodiernos líderes religiosos ‘contornam o mandamento de Deus’ por examinar a New Catholic Encyclopedia sob o verbete “Pacifismo”. Ali, entre outras coisas, esta enciclopédia assevera: 
Nem existe qualquer contradição intrínseca entre uma guerra justa e a ordem de Cristo para que amemos nossos inimigos. Uma guerra justa expressa ódio ao mal, ao invés de ao malfeitor. . . . Os católicos certamente estão livres para formar sua própria opinião quanto a se as condições exigidas para a justificação são prováveis de ser satisfeitas em qualquer guerra futura . . .” — Ed. 1967, Vol. 10, p. 856.
Como é que este raciocínio ‘engenhoso’ é desenvolvido na prática? 
Bem, quantas guerras pode encontrar na história, envolvendo populações católicas ou protestantes — por qualquer causa — que deixaram de satisfazer as “condições exigidas para a justificação”, de modo que o rebanho se recusasse a lutar pelos seus amos políticos? 
Se as igrejas encarassem as mesmas circunstâncias hoje como encararam sob os nazistas, crê honestamente que agiriam de modo diferente? Podem os católicos europeus e estadunidenses, para exemplificar, sentir-se seguros de crer que os milhões de católicos poloneses, húngaros e tchecos não atacariam seus irmãos na fé, caso haja um confronto entre o Leste e o Oeste? 
Ou o conceito mais realista é o expresso na revista católica, Mensageiro de S. Antônio, de que os sacerdotes e os ministros “geralmente transmitem a impressão de que abençoarão qualquer guerra ou aventura em que os líderes do estado decidam lançar-se”? — Maio de 1973, p. 21.
Ensina a igreja que a guerra é errada do ponto de vista religioso e cristão? Não. Ela continua se submetendo ás condições impostas pelos governos e "deixando livre" seu rebanho para fazer o que quiser.
 
Em contraste, Cristo Jesus, forneceu a seguinte regra do discipulado cristão: 
Nisto precisamente todos reconhecerão que sois meus discípulos: se tiverdes amor uns pelos outros.” Também disse a um discípulo que procurava defendê-lo pela força — certamente uma causa “justa”: “Guarda a tua espada na bainha, pois todos os que pegarem da espada pela espada morrerão.” — João 13:35; Mateus 26:52, tradução do Pontifício Instituto Bíblico de Roma.
Assim, se lhe pedissem que identificasse aqueles que são verdadeiramente dignos de levar o nome de “cristãos” hoje, usando as diretrizes fornecidas pelo próprio Jesus, poderia honestamente selecionar qualquer das igrejas da cristandade? Quem tem, na realidade, demonstrado o sinal identificador do verdadeiro amor, estabelecido pelo próprio Cristo? Quem é que ‘não ama por palavras nem com a língua, mas por obras e em verdade? (1ª João 3:18, PIB).
Encontrando esse terá encontrado o verdadeiro cristão.



Fontes: Implícitas no texto.

quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Castrati - Mutilados em Nome da Religião

Os Castrati: 
Mutilados em Nome da Religião
Alessandro Moreschi, falecido em 1922, foi o último Castrati.
Vindo de família pobre, foi vítima tanto da ganância familiar como
da igreja. barbaramente mutilado na infância, não desenvolveu sua voz
natural de homem e foi condicionado a servir como cantor para agradar
os ouvidos do Papa, que julgava que essas vozes adulteradas eram,
não aberrações, mas "vozes de anjos"! ele pode ser ouvido até hoje: Confira:
https://www.youtube.com/watch?v=KLjvfqnD0ws



Quem Foram os Castrati?
Nos dias atuais, com a propagação da notícia da existência dos Castrati (que a Igreja Católica gostaria que todos esquecessem), que perduraram até o final do Séc XIX, alguns, destituídos de qualquer sentimento humanitário pelas vítimas,  tem argumentado que "era prática normal para a época" e que até mesmo os compositores clássicos "também usavam os castrati em suas músicas". Alguns também procuram justificar a igreja dizendo que "o número de meninos castrados foi pequeno em relação à população", como se um crime pudesse ser justificado desde que seja cometido contra "poucas pessoas". Não obstante a maioria dessas "defesas" são feitas por leigos e "perfis anônimos" (que podem ser fakes de sacerdotes) o que exclui a igreja de qualquer 'pronunciação oficial'.
Tais defesas porém não explicam ou justificam o erro da Igreja. A castração, longe de ser prática normal, conforme veremos, além de um ato grotesco e cruel, é também um hábito religioso pagão.
Os Castrati eram cantores com força de homem e voz de menino. Sua época foi realmente triste. Quem eram? A resposta a essa pergunta tem a ver com uma prática chocante: a mutilação em nome da religião.
O quadro  acima, do Séc XVIII, mostra que a castração era à usada para se castrar porcos. Era realizada principalmente em conventos. Dos milhares de meninos castrados, milhares morriam por causa da "operação". Dos que sobreviviam, poucos atingiam o "objetivo" da Igreja.

A Castração na História Humana
Há pessoas que nascem eunucos. Muitos, porém, são feitos eunucos pelos homens. São homens na forma e na estatura, mas não podem procriar. Enquanto cresciam, ou mesmo mais tarde na vida que, por opção ou à força, foram castrados.
O que leva alguém a mutilar a si mesmo ou a outros homens? Os motivos são, com frequência, religiosos.
Milhares de anos atrás, a castração era usada como forma de punição pelos assírios. No Egito, era a pena pelo adultério. Se um ladrão fosse apanhado roubando um templo na antiga Friesland — hoje parte da Holanda — era emasculado antes de ser morto.
Em Roma, a castração era proibida durante os reinados dos Imperadores Domiciano e Nerva, no primeiro século EC, mas foi reinstituída nos anos de decadência do Império. As leis promulgadas no nono século pelo Rei Alfredo, o Grande, da Inglaterra, puniam o criado com a castração, se ele estuprasse uma criada.
Os eunucos também eram uma presença destacada nos rituais religiosos. Junto com as virgens, serviam à deusa Ártemis na cidade de Éfeso. Os homens castravam-se em cerimônias frenéticas em honra da Astarte síria, de Hierápolis, e depois usavam roupas de mulher pelo resto da vida.
Aquele que castra a si mesmo ou a outrem não pertence a meus seguidores”, proclamou Maomé. Apesar desta proibição, os eunucos eram valorizados como servos nos países muçulmanos, como guardiões de haréns e santuários. Por isso, o comércio desses escravos continuou. Jovens arrancados do Sudão e de países vizinhos no norte da África davam lucros enormes para os comerciantes de escravos.

Eunucos na Cristandade
No início do século 19, Johann L. Burckhardt visitou o Alto Egito, onde viu meninos castrados que seriam vendidos como escravos. A operação era realizada em meninos entre 8 e 12 anos. Os “cirugiões” (na verdade eles não tinham formação nenhuma em medicina) eram dois monges da Igreja Cóptica. “Sua profissão”, comentou Burckhardt, “era desprezada”.
Isso evoca a pergunta: Até que ponto a cristandade participou nessa prática, e por que razões?

A Igreja Proibe a Castração
Orígenes (foto)  — mais conhecido por sua Hexapla, versões das Escrituras Hebraicas dispostas em seis colunas — nasceu por volta de 185 EC. À idade de 18 anos, já era bem-conhecido por seus discursos sobre o cristianismo. Todavia, preocupava-o que sua popularidade entre as mulheres não fosse mal-interpretada. Tomando as palavras de Jesus em sentido literal — “há eunucos que se fizeram eunucos por causa do reino dos céus” (Mateus 19:12) — ele se castrou.  Um ato imaturo e impulsivo do qual se arrependeu profundamente anos mais tarde.
É curioso que já o primeiro cânon do Concílio de Nicéia, no ano 325 EC, excluiu expressamente do sacerdócio homens que haviam se emasculado. O Dr. J. W. C. Wand diz a respeito dessa resolução: “É possível que alguns tivessem manifestado o desejo de seguir o exemplo de Orígenes neste respeito e fazer-se eunucos . . . , e era essencial que os cristãos não fossem incentivados a seguir um costume que era muito mais característico dos devotos de algumas religiões pagãs.
Com essa decisão importante, os líderes religiosos da cristandade procuraram proscrever para sempre a prática abominável da castração. Todavia, apesar desse reconhecimento de que a castração era um hábito pagão proibido para os cristãos, aconteceu exatamente o contrário. Considere primeiro a seguinte narrativa bem conhecida.

No ano 1118, Pedro Abélard, filósofo e estudante de teologia, apaixonou-se por Heloísa, uma jovem da qual ele era professor particular. Como Abélard ainda não havia sido ordenado e não estava sob o voto do celibato, eles se casaram secretamente e tiveram um filho. Mas visto que o tio de Heloísa, Fulbert, cônego da catedral católica romana de Paris, achou que ela havia sido seduzida, mandou que Abélard fosse castrado à força. Essa barbárie, ordenada por uma autoridade do alto escalão da Igreja, levou dois de seus perpetradores a serem punidos com o mesmo castigo, em retaliação.
De modo que a castração ainda era uma punição aceitável em certas circunstâncias. Essa prática contrária à lei de Deus e mesmo a lei da própria Igreja, porém, iria em breve ser promovida na Igreja Católica Romana por causa do canto na igreja.

Os Coros de Igrejas
O canto tem um lugar importante na liturgia ortodoxa oriental e na católica romana, sendo que o esteio do coro de igreja são os meninos sopranos.
Mas a voz dos meninos muda no início da adolescência. Como poderia a igreja resolver o problema da constante troca de coristas e do treinamento envolvido? É verdade que muitas vezes se recorria a um recurso vocal um tanto menos gracioso conhecido como falsete, mas este não era substituto à altura dos meninos sopranos.
As sopranos eram a alternativa óbvia, mas já nos primórdios da Igreja, o papa havia proibido as mulheres de cantar na igreja. Outro problema neste respeito era que os cantores de igreja podiam ser chamados para auxiliar o sacerdote, dever reservado exclusivamente aos homens. De modo que as mulheres não podiam integrar os coros de igreja.
Em 1588, o Papa Sisto V proibiu as mulheres de cantar no palco de qualquer teatro público ou lírico. Essa proibição foi reiterada pelo Papa Inocêncio XI cerca de 100 anos mais tarde. “A desaprovação de mulheres como artistas de teatro e a associação de seus nomes à prostituição e à licenciosidade era uma tradição antiga que remonta aos dias de Sto. Agostinho e até antes”, observa o pesquisador Angus Heriot. Ao tomar essa posição inflexível, a Igreja abriu caminho para um problema ainda mais sério: os castrati!

Diversão para Sacerdotes.
A cruel castração era vista como "divertida" pelos sacerdotes.
Por exemplo, ao escrever seu livro (Ajustamento Sexual para Meninos), o Rev. David Codpiece localizou em uma loja de antiguidades na Balls Pond Road, em Londres, uma fotografia de quatro Castrati datada de 1886. Na parte de trás da foto, escrito a lápis, estavam os nomes deles: George Fluke, Harry Entwhistle, Albert Catflap e Freddy Losango. Codpiece os conhecia desde que esses quatro rapazes eram membros do Coro Castrati da Catedral de Wenchoster até 1897. Quando demitiu-se e emigrou para a Austrália. Colou a foto na contracapa do exemplar do seu livro deixado na Catedral, o Rev. Codpiece deixou uma mensagem aos regentes da catedral que dizia: "Esta é uma cidade "bonza" (boa), companheiros. Nós criamos o nosso negócio em uma loja na rua principal e estamos indo muito bem. Nossos melhores votos a todos de volta em Wenchoster, especialmente ao jovem Jack Hoggins."
Codpiece foi um "Reverendo" que castrava meninos. Interessante é que na capa do seu livro estava escrito: "Uma divertida brincadeira através dos coristas castrados do 17º Séc. da Wenchoster Diocese".

A Cristandade se Envolve com a Prática Pagã

Os teatros líricos e públicos precisavam de sopranos, mas o coro papal também. O que poderia ser feito? Há muito se sabia que, se um menino fosse castrado, sua voz não se alterava. As cordas vocais cresciam só um pouco, enquanto o peito e o diafragma crescia normalmente. Por essa razão, o castrato tinha força de homem e voz de menino — “o tipo de voz que as pessoas imaginavam que os anjos possuíam”, comenta Maria Luisa Ambrosini no livro The Secret Archives of the Vatican (Os Arquivos Secretos do Vaticano). Também é possível determinar até certo ponto o tipo de voz, variando-se a idade em que a criança é castrada.
A Igreja Ortodoxa Grega usou os castrati em seus coros do século 12 em diante, mas o que faria a Igreja Católica Romana? Sancionaria e empregaria os castrati?
O padre Soto, cantor do coral papal em 1562, acha-se alistado nos arquivos do Vaticano como falsete. Mas Soto era um castrato. Assim, pelo menos 27 anos antes de 1589, quando a bula do Papa Sisto V permitiu a inclusão de quatro castrati no coro da Basílica de S. Pedro, o Vaticano sorrateiramente já havia abandonado a decisão do seu próprio Conselho de Nicéia.
Daí, em 1599, sem rediscutir sua própria proibição da prática pagã, o Vaticano "reconheceu" a existência dos castrati. E uma vez que a mais alta autoridade da Igreja, o Vaticano, sancionara abertamente a prática, os castrati passaram a ser aceitos. Gluck, Handel, Meyerbeer e Rossini estão entre os compositores que fizeram tanto música sacra como profana especificamente para castrati.

Crueldade E Tragédias Abafadas em Nome da Música Sacra
Os castrati logo se tornaram populares. O Papa Clemente VIII (1592–1605), por exemplo, ficou bastante impressionado com a agilidade e a doçura de suas vozes. O curioso é que qualquer pessoa que tivesse algo a ver com a castração devesse ser excomungada. Apesar disso não faltavam meninos castrados para os coros, porque as necessidades musicais da Igreja prevaleciam sobre sua própria proibição à castração.
Dizem que as lojas da época anunciavam: “Qui si castrono ragazzi” (Castram-se meninos). Uma barbearia de Roma proclamava com orgulho: “Castram-se cantores para o coro da capela papal.” Afirma-se que durante o século 18, uns 4.000 meninos italianos podem ter sido castrados para esse fim. Não se sabe quantos morreram em decorrência disso.


Ganância Familiar Envolvida
Por que os pais permitiam que seus filhos fossem mutilados? Em geral, os castrati vinham de famílias pobres. Se o filho mostrasse algum talento para a música, podia ser vendido, às vezes sem reservas, para uma instituição musical. E a igreja se aproveitava desse fato. Outros eram recrutados dos coros da Basílica de S. Pedro, em Roma, e centros acadêmicos apoiados pela Igreja. Os pais, naturalmente, tinham esperança de que os filhos ficassem famosos e fossem uma segurança financeira para eles na velhice.
Ao invés da Igreja desaprovar o comportamento ganancioso de famílias desesperadas ela se aproveitava dele de forma mais gananciosa ainda.


Desrespeito ás leis e Medo de Perder Fieis
Não eram raras as tragédias, quando ficava patente que a voz do menino não renderia o esperado. Johann Wilhelm von Archenholz, autor de A Picture of Italy (Retrato da Itália), escrito no final do século 18, explicou que os castrati que eram rejeitados, e os excedentes, recebiam “permissão para receber ordens [sacras]”, e rezar a Missa, mesmo isso sendo proibido e que eles não tivessem dom para isso. Isso seguiu o precedente extraordinário aberto na própria Basílica de S. Pedro, quando, violando-se o cânon da Igreja, dois castrati foram ordenados sacerdotes católicos romanos em 1599 e, outros, subsequentemente. A igreja desrespeitava suas próprias decisões.
O próprio Papa Benedito XIV fez menção da decisão do Concílio de Nicéia e admitiu que a castração era ilegal. Mas, tal era o apelo e a importância da música na Igreja que, em 1748, ele rejeitou resoluto a sugestão de seus próprios bispos de proscrever os castrati, por temer que as igrejas ficassem vazias se ele fizesse isso. De modo que os castrati continuaram a cantar nos coros das igrejas italianas, na Basílica de S. Pedro e na própria Capela Sistina, do papa. A crueldade contra as crianças, sancionada pela igreja, continuou até o Séc XIX.

Abusos Anexos Denunciados
Os castrati não viviam somente para cantar. O dia a dia deles era de sofrimento, por vezes indescritível. Podiam inclusive serem mortos, a bel prazer do Clero.
Em 1901, Simon Reeler, um ex-coroinha, publicou o que dizia ser suas reminiscências pessoais da vida do coro castrati da Catedral Wenchoster, onde denunciava toda sorte de brutalidades, tanto física como psicológica, por parte dos sacerdotes contra eles. Este trabalho foi imediatamente denunciado pela Catedral como falso, e após uma breve notoriedade, o volume desapareceu na obscuridade. Cópias dele são agora difíceis de obter, mas a própria biblioteca da Catedral mantém um exemplar a sorte. Hoje a opinião dos que consultam o livro é que muito do que foi escrito foi adulterado. Vários nomes foram alterados, assim como os locais dos incidentes mais ultrajantes.
Além disso os meninos eram obrigados a trabalhar todos os dias, em horário integral, inclusive cantando músicas nada religiosas e até pagãs, para corais populares (que pagavam à Igreja pelos serviços).


O Fim dos Castrati
É interessante notar que a Igreja Católica não abandonou essa prática, no final do Séc XIX, porque resolveu seguir suas próprias diretrizes ou então voltar atrás dessa prática pagã. o motivo foi novamente o medo. o medo da opinião pública.
Em 1898, como a opinião pública contra a castração crescia, o Papa Leão XIII discretamente aposentou os castrati do Vaticano, e seu sucessor, o Papa Pio X, proibiu formalmente os castrati na capela papal em 1903. Mas a bula do Papa Sisto V que deu início a eles jamais foi formalmente anulada.
O último castrato profissional, Alessandro Moreschi, morreu em 1922. Ainda se pode ouvir seu canto, gravado em 1902 e 1903. Os selos das gravações dizem que ele era “Soprano della Cappella Sistina (Soprano da Capela Sistina)”. “A voz”, escreve o crítico musical Desmond Shawe-Taylor, “inquestionavelmente a de um soprano, não se assemelha nem à de um menino nem à de uma mulher”.
Assim terminou a mutilação desumana de meninos em prol da arte. Uma “prática abominável”, diz a The Encyclopædia Britannica, sancionada e tolerada pela Igreja Católica Romana durante séculos.
Hijras - Os Modernos Castrados
Os castrati não existem mais. Mas significa isso que não há mais castração por motivos religiosos? Infelizmente, não! The Independent Magazine informa que, durante os anos 90 do Séc XX,  a Índia possuía até um milhão de eunucos, vivendo em comunidades religiosas. Quem são eles? Os hijras.
A maioria dos hijras são muçulmanos de nascença — embora existam muitos hindus entre eles — e todos adoram Bharuchra Mata, deusa hindu do Gujarat. Embora a maioria opte pela castração, há quem afirme que todo ano até mil indianos são emasculados à força para coagi-los a juntar-se aos hijras, depois do que são leiloados e vendidos ao guru que fizer o lance mais alto.
Os hijras são controlados por uma hierarquia de gurus, com clãs de hijras dividindo as cidades em territórios. Vivem de pedir esmolas nos templos e da prostituição. São geralmente desprezados, mas também temidos, porque as pessoas acreditam que eles possuem uma magia sinistra. Por esta razão, são pagos para abençoar bebês e recém-casados.
Dizem que alguns hijras fogem. Mas “a máfia dos hijra, que alegadamente controla as castrações”, informa a India Today, “opera sob o véu do segredo e do terror”.
Hoje em dia, alguns da igreja Católica criticam essa prática abominável, mas não ousam reconhecer que sua própria Igreja também já fez, de forma premeditada, a mesma coisa. Pior ainda: os hijras fazem isso por acreditarem no que fazem, mas a Igreja fez sabendo que era errado e indo contra sua própria decisão.


Ficará o mundo um dia livre de tais males? Sim, porque os pecados do império mundial da religião falsa — identificado na Bíblia como a meretriz “Babilônia, a Grande” — “acumularam-se até o céu”. Como fortalece a fé aprender que todas as práticas que desonram a Deus em breve terão um fim dramático! Por que não lê pessoalmente sobre isso no último livro da Bíblia, Revelação [Apocalipse], capítulo 18? Veja em especial os  versículos 2 e 5.

Observação:
A nota ao pé da página da própria Westminster Version of the Sacred Scriptures: The New Testament, católica romana, com respeito a ação de Orígenes, declara a respeito das palavras de Jesus sobre os eunucos: “Não em sentido físico, por mutilação carnal, mas espiritual, por propósito ou voto.” Similarmente, A Commentary on the New Testament, de John Trapp explica: “Não significa se capar, como fez Orígenes e alguns outros dos tempos primevos por entenderem mal o texto . . ., mas viver solteiro, para servir a Deus com mais liberdade.”


A Norma Mais Elevada
A Lei Mosaica declarava claramente que os eunucos não podiam fazer parte da congregação de Israel. (Deuteronômio 23:1) Sob a Lei, a castração era proibida. “A lei judaica”, comenta a Encyclopaedia Judaica, “abominava essas operações”. Nenhum israelita nem residente forasteiro era castrado para trabalhar no palácio dos reis de Israel, como se dava em outras cortes reais, como na do rei persa Assuero. — Ester 2:14, 15; 4:4, 5. A castração sempre foi uma prática pagã.